
A Edição 124 do Boletim das RSCM nas Nações Unidas destaca a 26.ª Reunião Anual da Conferência das Partes da Convenção – Quadro das Nações Unidas sobre Mudança Climática, mais conhecida como COP 26, que decorreu em Glasgow, de 31 de outubro a 12 de novembro. A COP 26 reuniu chefes de estado e representantes de alto nível de 197 nações, em representação de 95% do planeta, assim como cientistas, ativistas do clima, organizações religiosas, empresas e grupos de base de todos os continentes.
Iniciativas inter-religiosas na COP 26
Houve uma forte e significativa presença de grupos religiosos, começando com a organização de uma Vigília Especial de Oração Inter-Faith em 31 de outubro. As Irmãs Mary Jo McElroy, Margaret Lee e Veronica Brand juntaram-se a cerca de 300 pessoas na praça central de Glasgow, onde mais de uma dúzia de líderes religiosos representando as tradições cristã, muçulmana, judaica, sikh, hindu, budista, quaker e baha’i lideraram orações, partilharam leituras de suas escrituras sagradas e pediram uma forte bênção para os trabalhos da COP 26. Nessa mesma noite houve uma receção na Sinagoga Judaica para os “Diálogos Inter-Religiosos Talanoa”. Com o nome da tradição fijiana, o processo atrai os participantes para partilharem as suas histórias, construindo empatia e confiança que resultam em conhecimento partilhado e melhor tomada de decisões para o bem comum.
Metas e Resultados: Adaptação e Mitigação
Os quatro principais objetivos da COP 26 eram a longo prazo: assegurar emissões globais líquidas-zero até 2050, a fim de manter o limite de 1,50C de aumento de temperatura; adaptar-se para proteger as comunidades e os habitats naturais; mobilizar o financiamento para a adaptação climática; trabalhar em conjunto para produzir resultados.
A Declaração de Glasgow, alcançada em 13 de novembro, não conseguiu assegurar a meta de 1,50C, mas manteve-a em “suporte de vida” – com diferenças profundas que levaram a um compromisso enfraquecido.
Entretanto, alguns dos compromissos assumidos oferecem esperança: 153 países apresentaram novas ou atualizadas metas de emissões conhecidas como Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs); todas as partes concordaram que durante 2022 revisitariam e reforçariam as suas atuais metas de emissões, que precisam ser alcançadas até 2030; pela primeira vez desde o acordo de Paris de 2015, 190 Partes da Convenção concordam explicitamente em acelerar a eliminação gradual do carvão e dos “subsídios ineficientes aos combustíveis fósseis”; mais de 100 países assinaram o Compromisso Global de Metano para reduzir as emissões do mais potente poluente climático; os EUA e a China concordaram em trabalhar juntos nesta década para limitar o aumento da temperatura global.
Protegendo as florestas
As florestas saudáveis desempenham um papel fundamental na regulação do clima, absorvendo 1/3 das emissões causadas pelos combustíveis fósseis. A Declaração dos Líderes de Glasgow sobre Florestas e Uso da Terra foi um importante acordo anunciado nos primeiros dias da COP 26, firmado por 141 estados membros, representando juntos 90,94% de todas as florestas do mundo.
No entanto, permanece um certo ceticismo quanto à implementação dos compromissos assumidos, sendo o Brasil um caso notável. Atualmente, 22% da Amazónia está sob alta perturbação devido à degradação das florestas, à recorrência de incêndios e à desflorestação, enquanto quase um quarto (24%) da área florestal primária está sob alto risco de destruição e precisa de proteção imediata. Isto representa um “ponto de rutura” crucial e perda de resiliência do ecossistema. Houve um forte apelo dos líderes indígenas na COP 26. Destacando a campanha Amazónia pela Vida e a necessidade de preservar 80% da Amazónia até 2025, o líder indígena e Coordenador Geral das Organizações Indígenas da Bacia Amazónica (COICA) Gregorio Mirabel observou: “Estamos a chamar para proteger a Amazónia. Estamos na COP26 para ratificar a nossa proposta para que 80% da Amazónia permaneça viva”. Nós somos a Amazónia pela vida, somos o grito do ar, da água, dos criadores da floresta, estamos lá para obter respostas e ações dos Estados”.
Aplicando uma lente de Género à ação climática
Mulheres e meninas são desproporcionalmente impactadas pelos efeitos da mudança climática, especialmente nos países menos desenvolvidos. Não só as mulheres têm menos acesso a recursos do que os homens, mas são também obrigadas a encontrar novas maneiras de alimentar as suas famílias em tempos de escassez, más colheitas e crise financeira. Como Mary Robinson, ex-presidente da Irlanda e Alta Comissária para os Direitos Humanos, observou num painel sobre a mobilização de financiamento climático equitativo, justo e sensível ao género, as mulheres devem caminhar mais para encontrar água em tempos de seca, são mais propensas a morrer devido à poluição dos fogões de cozinha e são frequentemente as últimas a comer e as primeiras a ficar sem comida. As meninas são mais propensas do que os meninos a serem expulsas da escola em tempos de crise relacionada com a mudança climática.
A importância de aplicar uma lente de género à ação climática foi enfatizada em muitos dos eventos. Lamentavelmente, apenas um terço dos financiamentos atualmente destinados à adaptação climática leva em conta as diferentes necessidades de mulheres e homens.
Perda e Danos
Uma questão crítica nos últimos dias da COP 26 está relacionada com “Perdas e danos” – a questão da compensação pelos danos causados pelos desastres relacionados com o clima, e a devastação causada pela perda de vidas, cultura, biodiversidade, meios de subsistência e infra-estruturas. Os países mais pobres, que pouco fizeram para causar a crise climática, são muitas vezes os mais vulneráveis aos eventos extremos associados à mudança climática. Delegações dos países vulneráveis ao clima vieram à COP 26 com a determinação de ganhar um compromisso das nações mais ricas para estabelecer um fundo de compensação.
Uma proposta foi apresentada pelas nações em desenvolvimento para criar o “Glasgow Loss and Damage Facility”. O objetivo era ajudar a corrigir as necessidades de financiamento. Lamentavelmente, a cláusula foi retirada do texto no último dia das negociações. Um compromisso mais fraco para estabelecer o “Diálogo de Glasgow” sobre as disposições de financiamento durante os próximos anos tornou-se parte da declaração final.
NOTÍCIAS DAS RSCM
O grupo de Irmãs Mary Jo McElroy, Margaret Lee, Eleanor Dalton, Veronica Brand e as colaboradoras Mary Kate Torri e Maria Pizzoni esteve muito presente na COP 26. Embora não tivessem acesso ao principal centro de negociações oficiais (a Zona Azul), estavam próximas de pessoas comuns do Reino Unido e daqueles que se reuniam e se organizavam, caminhavam e rezavam – pedindo ações urgentes para enfrentar a mudança climática.
Dentro dos pavilhões da Zona Verde, e em outros locais em Glasgow, assistiram a painéis e eventos; ouviram testemunhos presenciais e virtuais. Juntaram-se a outras pessoas em locais de culto, nas ruas e na marcha global. As vozes eram fortes e as mensagens consistentes. Todos apelavam aos seus líderes para tomarem medidas urgentes. Estar presente na COP 26 foi uma oportunidade valiosa para unir o dinamismo dos movimentos de todo o mundo no apelo urgente pela justiça climática. Algumas das vozes que mais tocaram foram as dos povos indígenas, jovens e mulheres do sul global, os caminhantes/peregrinos vindos de diferentes credos.
Nesta edição partilham-se algumas reflexões pessoais sobre a experiência de participação das irmãs e colaboradoras.